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  • Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Polícia Federal' não convence com tentativa de trama apartidária

Atualizado: 12 de jan. de 2022


Durante coletiva de imprensa realizada em São Paulo na última semana, o diretor Marcelo Antunez (do fraquíssimo Até que a Sorte nos Separe 3) tentou desvincular Polícia Federal: A Lei é Para Todos de qualquer ligação partidária ou ideológica que o filme possa vir a ter. O cineasta, claramente, quer isentar o longa da briga entre os "coxinhas" e os "petralhas" para conseguir ganhar uma maior audiência nos cinemas e recuperar os mais de R$ 16 milhões investidos na produção.

O desejo de Antunez, porém, é dificílimo de ser concretizado. Ser apartidário e apolítico é, de um jeito ou de outro, uma forma de manifestar as suas opiniões -- só ver a campanha à Prefeitura de São Paulo em 2016, quando João Dória bradava que não era um político, mas um gestor. Não fazer política é fazer política. E o cineasta sabe disso. Sabe tão bem, aliás, que tentou blindar o seu filme de demonstrações políticas de todas as formas possíveis: no roteiro, nas atuações e até no investimento.

No entanto, essa blindagem ao redor de Polícia Federal -- como vou chamar o filme a partir de agora, para economizar palavras e poupar leitores da bobagem que é este subtítulo -- é o grande calcanhar de Aquiles da produção. Há tantas camadas em sua construção que o filme se torna artificial, formulaico e, em alguns momentos, caricato. Não há verdades e a produção, ainda que bem realizada tecnicamente, não passa a emoção e o senso de urgência que deveria ter.

O primeiro erro, que é fatal para um filme desses, está no roteiro da dupla Thomas Stavros e Gustavo Lipsztein (ambos da boa série 1 Contra Todos). A ideia era narrar a trajetória da Operação Lava Jato desde seu embrião, num caminhão de palmito, até o momento que o ex-presidente Lula passa pela condução coercitiva. No centro da trama, os investigadores Ivan (Antonio Calloni), Bia (Flávia Alessandra) e Júlio (Bruce Gomlevsky) -- além, é claro, do juiz Sérgio Moro (Marcelo Serrado).

O jeito de contar a história até que é bacana e há um momento interessante, a la Tropa de Elite 2, que mostra que a corrupção existe desde que criaram a caneta, se perpetuando de forma endêmica. Ainda assim, porém, a trama é prejudicada pela necessidade contínua de justificar todas atitudes e, até mesmo, justificar a existência do filme em si. São várias cenas que mostram um investigador ou um policial reafirmando que é imparcial ou que “já até fez campanha pro PT”.

Além de tirar o ritmo da história, que possui elementos policialescos, esse eterno retorno às justificativas ajuda a incrementar esse ar artificial da trama. Artificial, aliás, também estão as atuações. Calloni e Flávia se esforçam, mas os seus personagens são rasos demais e não há como crer que são reais -- qualquer pessoa, em algumas situações, explodiria e deixaria suas opiniões transparecer. Isso nunca acontece com os dois, que fazem personagens que são totalmente esquecíveis.

Bruce fica encarregado de fazer o policial explosivo, que mostra como está indignado com a situação das coisas. E aí, para apaziguar, mais momentos piegas como os relatos acima. Serrado como Moro, enquanto isso, tem um olhar vazio e o ápice de sua atuação é quando queima o dedinho em uma panela, numa tentativa de humanizar a personagem. E faltou coragem para criticar o juiz: o momento em que a gravação entre Lula e Dilma é “vazada”, por exemplo, não teve qualquer julgamento moral.

Antunez, surpreendentemente, até que consegue trabalhar bem com esta massa disforme e com tantas camadas protecionistas. Com ares de Spotlight e, em alguns momentos, até de Todos os Homens do Presidente, o cineasta brasileiro faz bem em seu trabalho de criar um clima de bastidores da investigação. A condução coercitiva de Lula, apesar da apatia por parte da personagem de Calloni, passa a emoção correta e mostra que a produção apostou alto no longa-metragem.

Pena, porém, que Ary Fontoura deixa toda essa sequência com ares de comédia. Antunez, aparentemente, se esqueceu de blindar a interpretação do ator veterano como Lula e criou um ex-presidente caricato demais para o momento -- lembra um pouco, até, o personagem Silverinha, de A Favorita. Gosto do Ary, mas acho que às vezes ele não consegue sair de um mesmo papel. Mais caricato que ele apenas o Japonês da Federal, que tem passagem relâmpago na película.

Por fim, não podemos esquecer de comentar a blindagem no investimento feito no longa. A produção optou por não usar leis de incentivo, como a Lei Rouanet, e acabou captando todo dinheiro da iniciativa privada. O único problema disso está no fato de que não foi revelada a origem dos R$ 16 milhões que financiaram o filme. Boatos e teorias conspiratórias até já dizem que foi a própria Polícia Federal que deu dinheiro à produção -- boato que, em minha opinião, é completamente infundado

No fim, Antunez fez mais política do que queria e, ainda assim, Polícia Federal ficou alguns degraus abaixo em qualidade. Culpa da blindagem excessiva, que deixou toda a história da investigação coberta por situações, atuações e direção que tentou, desesperadamente, fazer um filme que agrade os dois lados da moeda política. Se deu certo neste ponto, só saberemos a partir de quinta-feira, quando o longa chegar às telonas. Até lá, ficaremos com o noticiário de Brasília, que já é um verdadeiro filme por si só.

RUIM

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