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Crítica: 'Allen vs Farrow', da HBO, não passa de um trabalho de assessoria

Atualizado: 14 de mai. de 2021


Sinceramente, não interessa o que eu, você ou qualquer pessoa no mundo acha sobre o caso Woody Allen x Dylan e Mia Farrow. Somente duas pessoas sabem exatamente o que aconteceu naquele dia em que Allen foi visitar as crianças na casa de Farrow -- e alguém, o cineasta ou sua filha adotiva, está mentindo. Investigações já ficaram do lado de Allen. Movimentos, de Farrow.


Eu, obviamente, tenho minha opinião sobre tudo isso, após muita reflexão nos últimos anos. Mas isso, novamente, não interessa. O que está em foco, aqui, é a produção Allen vs Farrow, série documental da HBO de quatro episódios, com mais ou menos uma hora cada um. Ao longo de várias entrevistas e boas imagens de arquivos, a série mostra o olhar dos Farrow sobre o caso.


Para quem não sabe, um pequeno contexto. Allen e Farrow tiveram uma relação turbulenta, mas feliz. Adotaram crianças juntos e tiveram filhos. No entanto, a coisa desandou de vez nos anos 1990, quando Farrow começou a desconfiar da proximidade de Allen com a filha Dylan. Tempos depois, estourou o romance do cineasta com Soon-yi, filha de Farrow com o ex André Previn.


Não dá pra negar que essa relação de Soon-yi com Allen é, no mínimo, bizarra -- os dois estão juntos até hoje, vale dizer. No entanto, o foco aqui é outro. É a relação de Allen com Dylan. A garota, filha adotada do casal, revelou em certo dia para a mãe que tinha sido abusada por seu pai, no sótão de casa. Allen nega. A partir daí, nasce uma imensa guerra de narrativas sobre.


O fato é que Allen vs Farrow é um documentário extremamente manipulador. Extremamente. Não é problema comprar um lado, algo que o filme faz logo de cara, apoiando Dylan. No entanto, outra coisa é manipular a audiência. Omitir fatos. A série da HBO Go brinca o tempo todo com as emoções do público, numa exploração barata, tentando convencer a audiência à todo custo.

Dylan, por exemplo, era bem pequena quando tudo aconteceu -- vale lembrar da Escola Base, quando falamos disso, não é? No entanto, a direção trata os relatos da filha de Mia como se fosse algo muito vívido em sua mente. Como se tivesse acontecido ontem. Além disso, toda vez que ela fala algo, surge uma foto de Dylan criança, com cara de choro e tristeza.


Opiniões de Woody Allen, retiradas de uma narração de seu livro, são rebatidas com outras opiniões. Não com fatos, não com provas. Mas são opiniões com peso de verdade na série.


São artifícios baratos para convencer o público com uma emoção quase que inexplicável. Além disso, o filme omite fatos importantíssimos, deixa histórias para os créditos -- em determinado episódio, mostra um outro filho, Moses, defendendo a mãe, enquanto sua opinião mais recente é mostrada só no último segundo de filme, contra Mia. E a história dos filhos adotivos de Farrow?


São peças importantes dessa história que são ignoradas de maneira leviana. Investigações que concluem à favor de Allen são continuamente desacreditadas, mas sem grandes embasamentos. A opinião de Moses Farrow, que diz ter sofrido abuso físico pelas mãos de Mia, é desacreditada de maneira agressiva. Como isso pode ser aceitável em uma produção dessa?


É óbvio que é preciso ter uma voz para se posicionar contra tudo o que Woody Allen pregou. Há indícios fortes de que o cineasta tem, sim, atração por mulheres mais jovens -- o relacionamento com Soon-Yi é a prova cabal disso. Mas não dá para usar trabalhos do cineasta pra provar qualquer coisa. Não dá. A arte de uma pessoa não é, necessariamente, sua opinião.


Ao final da série, é muito fácil acreditar em Dylan, torcer por Dylan. É um sentimento que parece genuíno e que, no fundo, foi apenas construído com muita semiótica e edição emocional. Não dá para dizer quem está certo -- ao contrário de casos como o de Polanski ou Weinstein, colocados lado a lado com Allen na série. E, sem dúvidas, não dá pra concluir nada com essa série.

 
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