Numa noite fria dos Estados Unidos, a idosa Ruth (Blythe Danner) decide sair de casa sem avisar ninguém. Bota um casaco, pega a bolsa e sai rumo à estação de trem mais próxima. Quando o marido Norbert (Robert Forster) acorda, leva um susto com a ausência da esposa. Afinal, ela está entrando em um estágio avançado de Alzheimer e não pode ficar sozinha. Com isso, os filhos Nicky (Michael Shannon) e Bridget (Hilary Swank), além da neta Emma (Taissa Farmiga), vão correndo ao socorro dos familiares.
Esta é a trama de Tudo o que Tivemos, longa-metragem que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 2. Dirigido pela estreante Elizabeth Chomko, o filme parece ser, num primeiro instante, mais uma daquelas histórias que mergulha na intimidade das famílias norte-americanas como o drama Álbum de Família, que tem show de atuação de Meryl Streep, ou a comédia fraquinha Sete Dias Sem Fim. No entanto, o novo longa se aproxima bem mais do bom Nebraska, concorrente ao Oscar.
Afinal, mais do que apenas contar a história de confluência desses parentes, Chomko mostra o impacto do Alzheimer no núcleo familiar e, a partir disso, como as coisas se desenvolvem entre o marido, os dois filhos e a neta. É um roteiro muito bem escrito pela própria diretora e que mostra essa família de maneira nua, crua, sem rodeios. Ainda que o personagem do sempre ótimo Michael Shannon (A Forma da Água) seja subaproveitado e tenha um arco tão coadjuvante quanto o da jovem Farmiga (A Freira).
O foco, afinal, está na relação e na vida dos personagens de Swank (Menina de Ouro) e de Robert Forster (Jackie Brown). Ela continua entregando atuações acima da média e ajuda a elevar o nível do filme. O drama envolvendo seu casamento, o relacionamento com a filha e, principalmente, com o pai e a mãe é emocional, vívido e muito real. Forster, enquanto isso, aposta num tipo mais durão, difícil de simpatizar, mas que vai derretendo suas cascas aos poucos, mostrando toda complexidade do personagem.
Blythe Danner (Entrando numa Fria) é o "pivô" de toda essa situação, mas não possui um desenvolvimento profundo -- afinal, sua memória está desaparecendo e há pouco o que criar em cena. No entanto, isso não significa que ela não tenha um trabalho complexo de fazer. Retratar o Alzheimer de maneira correta é difícil, por vezes doloroso. Foi bem.
Pena que, em alguns momentos, a trama fique muito genérica. Não há problemas disso, exatamente, já que facilita a identificação. Mas podia ter ido um pouco além da fórmula.
É, assim, um filme de personagens. As histórias e as situações vão surgindo a partir do que eles falam, fazem, sentem. É interessante, e muito emotivo, ver a conclusão das histórias e como a situação mexe com cada um dos personagens. O final, inclusive, é muito bom, real, forte, inesperado. Traz um tempero diferenciado ao filme, que ajuda a elevar a qualidade geral de Tudo o que Tivemos. Em época de Vingadores: Ultimato, pode ser uma boa pedida ver um bom drama familiar. Ajuda a pensar, refletir, sentir.
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