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  • Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'A Cabeça de Gumercindo Saraiva' mescla História e ação


Um dos acontecimentos mais interessantes e particulares da História do Brasil é a Revolução Federalista. Localizada no sul do Brasil, a movimentação rebelde insurgiu após a Proclamação da República, quando grupos da região exigiam a saída do governador Júlio de Castilhos ao mesmo tempo que pediam uma maior independência do sul. As reivindicações geraram conflitos sangrentos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Hoje, integrantes do movimento ainda são relembrados e celebrados.

Além disso, claro, surgiram mitos ao redor do momento histórico. Um deles é a história que envolve Gumercindo Saraiva. O caudilho foi um dos principais nomes da Revolução Federalista e morreu em campo de batalha, defendendo suas convicções. O corpo de Gumercindo, porém, não permaneceu em paz após a morte: seu corpo foi desenterrado, segundo relatos e lendas da região, e teve a cabeça decepada e entregue ao governador dentro de uma caixa de chapéus. O corpo, então, ficou para sempre sem o membro.

A trama de A Cabeça de Gumercindo Saraiva parte dessa história. Sem explicar muito sobre o movimento em si e sem cair na tentação do didatismo, o diretor Tabajara Ruas mostra a jornada de grupos contrários ao caudilho percorrendo os pampas atrás do governador para, enfim, entregar a cabeça. Enquanto isso, o filho de Gumercindo, junto com alguns outros amigos ou familiares próximos, se empenham na tentativa de recuperar a cabeça do líder e enterrá-la, de maneira digna, junto ao corpo exumado

Assim como em Netto e o domador de cavalos e, principalmente, Os Senhores da Guerra, Tabajara une a história sulista do Brasil com cenas de ação bem coreografadas, emocionantes e que conseguem atingir um grande público. Enquanto o roteiro traz poucas informações e pode limitar o público, então, a direção certeira do cineasta ajuda a compôr uma produção mais abrangente e de fácil absorção. Mesmo que a pessoa não esteja entendendo os meandros da Revolução ali na tela, é fácil torcer por um dos galãs que por ali aparecem -- no caso, Leonardo Machado, Murilo Rosa e Marcos Pitombo.

Afinal, refletindo a realidade do Brasil de hoje em dia, a história da Revolução Federalista não deixa de ser polarizada politicamente. Assim como disse Tabajara Ruas durante a apresentação do filme na noite de pré-estreia, há um diálogo entre as partes. "As pessoas, no filme e hoje em dia, são movidas por paixões, por ideologias. É um conflito que, mesmo tendo acontecido no século retrasado, encontra consonância no Brasil de hoje", disse o cineasta. E de fato: difícil não identificar linhas que se cruzam.

Isso, junto com a atuação louvável do saudoso Leonardo Machado (Yonlu) e as boas interpretações de Murilo Rosa (A Comédia Divina), Marcos Verza (A Oeste do Fim do Mundo), Simar Antunes (A Superfície da Sombra) e Allan Souza Lima (Aquarius) ajudam a dar fôlego e ritmo à trama. História se complementa com ação e aventura. Atuações fortes (Machado) com interpretações mais delicados (Simar, Rosa). É, basicamente, um filme de equilíbrios e que, afinal, consegue trazer algumas boas discussões e reflexões.

Há problemas, como o excesso de falta de didatismo, algumas cenas de efeitos especiais mal feitas e personagens que somem. Mas a ideia geral, bem executada e trazendo um tema importante, mas esquecido, faz com que A Cabeça de Gumercindo Saraiva se torne um filme atual, apesar de seu caráter de época, e interessante para ser discutido e relembrado. Bom ponto na carreira de Tabajara Ruas, que se firma num cinema histórico, independente e de forte cunho político. Vale assistir e conhecer.

 

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