O começo do longa-metragem @Arthur.Rambo: Ódio nas Redes é altamente dinâmico: começa com o jovem escritor Karim D. (Rabah Nait Oufella) sendo celebrado. Ele acabou de participar de um programa famoso e não há dúvidas de que ele é um dos grandes nomes da literatura contemporânea. No entanto, no meio da celebração, uma pedra no caminho: descobrem que é ele quem está por trás do perfil Arthur Rambo no Twitter, repleto de ataques preconceituosos.
A partir daí, Laurent Cantet (do excepcional Entre os Muros da Escola) passa a fazer um exame minucioso da cultura do cancelamento. O cineasta não mostra preocupação alguma em fazer juízo de valor aqui, mas apenas mostrar esse processo de demolição da imagem. É a parceira que não quer nem conversar com ele, amigos de longa data que se sentem traídos, a editora que está mais preocupada em se salvar, por aí vai. Karim, aos poucos, vai sendo apagado da História.
@Arthur.Rambo: Ódio nas Redes traz, assim, um olhar contemporâneo apurado e que, apesar de ser uma história da França, diz muito também sobre o Brasil -- Karim poderia muito bem ser personagem do universo virtual tupiniquim ou de qualquer outro país por aí. Afinal, a internet universalizou as discussões e o sentimentos, tornando quase tudo padronizado. E isso vale para o cancelamento, as reações, a forma de lidar com o próximo. É quase um gesto mundial.
Rabah Nait Oufella (Raw) é o coração da história: preso em uma estrutura quase de thriller, que coloca o personagem no meio de um monte de dedos apontando, o ator consegue aprofundar seu personagem com olhares e gestos que traduzem tudo que ele está sentindo naquele momento. É, aliás, a forma que Cantet encontra para dizer algo, emitir sua opinião sobre esse movimento e provocar uma reflexão que vá além do óbvio sobre o que é o cancelamento.
Além disso, há algumas boas surpresas no roteiro, que abraça as controvérsias. O fato de Karim ser imigrante causa questionamentos sobre aquele ódio: é apenas pelo que ele falou ou será que há algo a mais por trás do país que colocou Le Pen no segundo turno das eleições de 2022? Será que Karim acreditava naquilo tudo que postou ou era apenas um exame, um teste, uma brincadeira? E os amigos que sabiam de tudo? Eles podem se isentar da culpa e julgar o outro?
O calcanhar de Aquiles de @Arthur.Rambo: Ódio nas Redes, assim, está na forma que o roteiro introduz algumas discussões. Enquanto a direção de Laurent Cantet traz um tratamento frio e com algo a dizer, o roteiro abraça um didatismo que não encaixa -- principalmente no terceiro ato, quando a família do personagem entra com mias força na trama. Situações são artificiais e as controvérsias não são tão bem exploradas. Muita coisa fica no ar, muitas outras são forçadas.
@Arthur.Rambo: Ódio nas Redes termina, assim, em um tom baixo. Os acertos ficam esquecidos lá no começo, enquanto o final chega com certo desapontamento. Poderia ser melhor, certamente, se Laurent Cantet tivesse explorado mais a aspereza dramática da coisa. Mas, ainda assim, saiba que este longa-metragem francês traz algumas reflexões que, mesmo terminando mal, ficam martelando na nossa cabeça. Afinal, como nossa sociedade está lidando com o outro?
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