Um grupo de trabalhadores, em algum subúrbio de Dakar, está revoltado. Após meses construindo uma torre futurista, o pagamento não chega. Vão cobrar o patrão e ele desvia do assunto. É a gota d'água. Saem dali, se despedem de suas esposas, amantes e namoradas e caem no mar. Destino? Algum país que tenha melhores condições. E é a partir disso que as mulheres tentam continuar suas vidas, com a dor da ignorância.
Esta é a trama do poético, mas sonolento, Atlantics. Escolhido de Senegal para concorrer a uma vaga no Oscar e premiado em Cannes, este longa-metragem original da Netflix parte da história destes homens insatisfeitos para tecer uma trama simbólica, mística e sobrenatural sobre essas mulheres que de nada sabem sobre seus maridos e amantes, mas que esperam. Esperam tanto que se tornam um canal de comunicação.
Dirigido e roteirizado pela cineasta Mati Diop (do documentário Mille soleils), o filme possui, basicamente, dois arcos narrativos. Em um, toma assuntos místicos e sobrenaturais emprestados para dar vida e particularizar a história para dentro do País africano. Em outro, acompanha a jornada da jovem Ada (Mame Bineta Sane), que precisa lidar com um casamento forçado e a partida do amante para a escuridão do oceano.
Como ressaltado, há poesia em Atlantics. Seja por conta da história em si, repleta de significados e de uma metáfora embutida dentro de suas linhas, ou pelo cuidado estético de Diop na hora de contar essa trama. As matizes azuis e esverdeadas, que tomam conta do longa-metragem, dão o tom da historia e acabam por criar uma ambientação que coloca Senegal dentro do mar. No final, Atlantis está logo ali, na charmosa Dakar.
Além disso, a boa atuação da estreante Mame Bineta Sane dá um colorido especial. Ela tem força, poder interpretativo e uma capacidade de trafegar entre real e sobrenatural.
Mas, apesar de todos esses pontos positivos, Atlantics é um filme sonolento demais. As coisas demoram a acontecer, a avançar. Quando acontecem, pouco é explicado. A explicação, assim como a trama, vem a passos lentos. Tudo é devagar, tudo é calculado. Dessa forma, a naturalidade se esvai e o longa-metragem se tornam artificial, arrastado. Parece que Diop quis torná-lo lento para ser natural. Mas o efeito é contrário.
No final, a sensação é de que Atlantics é maior do que O Irlandês. Ainda que tenha belas cores, boa música e uma história de romance simpática, demora para o filme ter algum impacto. E quando o impacto vem, o espectador já está descolado da narrativa e o efeito não é o mesmo. Uma pena. Tinha potencial, se Diop tivesse trabalhado melhor a união de fantasia e realidade. Do jeito que ficou, é um filme que passa batido. Esquecível logo.
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