Foi em 2015, quando ainda estava começando minha carreira como então repórter de tecnologia no Estadão, que descobri que existia um campo da ciência que estudava novas tecnologias a partir da natureza. Fiquei fascinado. Cientistas e engenheiros poderiam aprender muito construindo um robô de um pinguim, por exemplo, e notando benefícios de seu funcionamento na mecânica. Achei que essa magia estaria em Biocêntricos, estreia de quinta-feira, 16.
Dirigido por Fernanda Heinz Figueiredo (Sementes do Nosso Quintal) e Ataliba Benaim (Saúde S/A), tem como objetivo falar exatamente sobre a biomimética -- que é a incorporação de conceitos da biologia dentro da ciência e da engenharia. Com filmagens no Brasil, nos EUA, no Japão e na Costa Rica, o longa acompanha principalmente a bióloga e ativista Janine Benyus influenciando a obra de ecologistas, arquitetos, designers, químicos, engenheiros e biólogos.
Por si só, é um tema interessante e a história de Benyus, pouco conhecida, é inspiradora. É curioso ver as possibilidades de trocas entre biólogos e engenheiros, mostrando principalmente como ensinamentos da biologia podem fazer uma empresa economizar alguns milhões aqui, uma máquina ser eficiente acolá e por aí vai. São trocas interessantes e que mostram como nós não mandamos na natureza e que, ao contrário do que parece, temos muito a aprender com ela.
Só que os acertos de Biocêntricos ficam por aí mesmo. O documentário tem um problema central extremamente incômodo: fala muito sobre as iniciativas que existem ao redor do mundo nesse sentido e pouco de como isso afeta as nossas vidas. Até há um relance disso quando contam a história de um engenheiro japonês que se inspirou no mergulhão para aumentar a velocidade de um trem-bala. Mas só. O resto é blá-blá-blá de empreendedores sonhadores.
É ruim, muito ruim, ficar só nesse papo corporativo. Não só afasta a narrativa do público, como também soa como propaganda. Quando entra em cena uma grande empresa brasileira de cosméticos no filme, falando sobre suas ações de biomimética, deu vergonha alheia na sala de cinema. Me revirei na poltrona. Parecia um product placement, com o documentário exaltando as ações da gigante dos cosméticos, mas sem mostrar nada de concreto. São só ideias.
Saí da sessão de Biocêntricos incomodado e triste. Queria ter ouvido mais ideias, mais possibilidades. Queria ter saído de lá incomodado, provocado, exultante. Mas não. Passei um pequeno tempo de minha vida sentado ouvindo conversas de empreendedores, quase todos eles brancos, sobre como a biomimética é legal, como Janine é genial. Só que, se me perguntarem o que a biomimética pode mudar a minha vida ou a sua, não sei dizer. E isso não podia acontecer.
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