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  • Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Colheita Amarga' aposta no épico, mas acaba no melodrama


A cada cinco filmes do grande circuito de cinema sobre a Rússia, seis tratam personagens do país como vilões, terroristas ou ameaças globais. É um pensamento que vem da Guerra Fria, quando os Estados Unidos passaram a dominar a cultura ocidental, e que perpetuou a ideia preconceituosa de que os russos são os malvados da história toda. Por isso, é um alívio quando chega um filme que vai além do maniqueísmo costumeiro.

Colheita Amarga, sem dúvidas, trafega nesse terreno. Ainda que o vilão da história seja um russo -- o ditador Joseph Stalin -- e os mocinhos, de fato, sejam os ucranianos, é um filme que se aprofunda num momento histórico pouco conhecido e ainda muito nebuloso, fugindo do maniqueísmo clássico do cinema comercial. Que pena, porém, que uma história tão importante -- e um filme com tanto potencial -- tenha caído em mãos erradas.

O longa-metragem, dirigido pelo alemão George Mendeluk, se aprofunda no período conhecido como Holodomor, quando o regime de Stalin levou a população da Rússia e adjacências ao caos, fazendo com que pessoas morressem de fome e desnutrição. Colheita Amarga, especificamente, mostra a rotina de um pequeno vilarejo ucraniano frente à essas adversidades e, principalmente, a luta de Yuri (Max Irons) contra o governo.

De fato, é uma história triste e assustadora, podendo render um filme a la O Pianista ou A Lista de Schindler. Afinal, mesmo não se passando durante a Segunda Guerra, mostra o ser humano em meio ao caos político da época. No entanto, Mendeluk é um diretor muito pouco talentoso em seu ofício. Dona de filmografia nada invejável, dirigindo Os Enigmas da Esfinge Mortal ou Ameaça sem Controle, o cineasta transforma o épico em melodrama.

Colheita Amarga parece uma longa novela da TV Record, onde as histórias menores se atropelam e a questão técnica é lamentável. Sobre este último ponto, há algumas coisas a exemplificar, como a imagem de cavalos andando num gramado servindo como cena de transição ou, ainda, incêndios sendo feitos em computação gráfica. É algo visível e que tira o espectador da história, por mais interessante ou enérgica que ela seja. Erro fatal.

Porém, a história também não é de toda correta. Ainda que sua essência seja interessante, como já falamos, as pequenas tramas -- e até o arco do protagonista -- são desinteressantes. O diretor opta por contar dezenas de histórias no espaço de 100 minutos. No final, porém, isso não causa dinamicidade, mas artificialidade. Não tem como comprar alguns romances, algumas amizades, algumas tradições. Pouco é aprofundado.

Max Irons (A Dama Dourada), Samantha Barks (Os Miseráveis) e Terence Stamp (Grandes Olhos) até tentam levar qualidade à trama com boas atuações, mas o tom novelesco acaba por tomar conta de tudo -- o final do personagem de Stamp beira o ridículo; um absurdo para um ator tão bom. A falta de cadência da edição também tira o foco do espectador na trama, deixando tudo travado. Só uma ou duas cenas de ação convencem.

O pior é que Colheita Amarga, sem dúvidas, vai causar um debate acalorado -- a esquerda vai dizer que Holodomor não existiu, a direita vai querer diminuir o socialismo. É aquela briga de sempre. Mas Colheita Amarga nem vale isso. Tem uma boa história, atores esforçados e um final até que interessante. Mas só. De resto, continua viva a vontade de ver um filme grandioso e comercial sobre a Rússia a ser tratado de forma honesta e caprichosa.

 
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