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  • Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Enquanto Houver Amor' mescla dureza da vida com poesia da família


Uma das primeiras cenas de Enquanto Houver Amor é sintomática do que virá a acontecer ao longo dos 100 minutos do filme. Edward (Bill Nighy) chega do trabalho, cumprimenta rapidamente a esposa Grace (Annette Bening) e vai fazer um chá. Logo depois, começa uma dinâmica que marca aquela relação: de um lado, Edward parece acuado, tímido, desajeitado; do outro, Grace se torna rapidamente inquisitiva, questionadora, explosiva, emocional.


É a partir desse embate que nasce a trama do longa-metragem, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 11. Dirigido e roteirizado por William Nicholson (À Luz do Fogo), Enquanto Houver Amor traz a própria experiência do cineasta com o relacionamento de seus pais, que se separaram após 33 anos de relacionamento. Aqui, Nicholson é interpretado pelo jovem Josh O'Connor (O Reino de Deus), precisando se equilibrar entre a rixa de seus pais.


Primeiramente, precisamos destacar a pedra fundamental do longa-metragem britânico: as atuações. Bill Nighy (Questão de Tempo), Annette Bening (Beleza Americana) e O'Connor foram colocados em um desafio e tanto, mas conseguiram recompensar o espectador. O rapaz consegue interpretar com precisão esse jovem na linha de tiro, sofrendo em silêncio e tendo que amparar os pais. Bening é marcante com sua personalidade forte e emoções à flor da pele.

Mas quem rouba a atenção completamente é o veterano Bill Nighy. Ele fica com o papel mais complicado de Enquanto Houver Amor: é este homem, com responsabilidades, que está absolutamente acuado pela vida. Ele não consegue olhar a esposa nos olhos pela vergonha do que fez (e que vai ser revelado adiante) e, infeliz, não consegue reagir. Não a ama mais, mas também não encontra meios de ser amado. É um dilema potente que Nighy coloca na tela.


Enquanto isso, pelo lado da direção e roteiro, William Nicholson mostra que sabe misturar a aspereza da vida com a poesia dos encantos. O relacionamento dos pais, assim como a vida do filho é afetada, ganham a tela com simplicidade, mas elegância. O formato geral da história lembra bastante História de um Casamento, ainda que não tenha exatamente as explosões do longa-metragem de Baumbach. Aqui, tudo está nas entrelinhas, nos olhares, nos gestos.


Há algumas derrapadas de roteiro, com a história perdendo o ritmo lá pela sua metade. Quando Nighy e Bening passam a se encontrar menos em cena, com a maioria dos problemas se concentrando no personagem do filho, Enquanto Houver Amor perde um pouco de seu impacto e de sua grandiosidade encontrada nessa simplicidade cotidiana. Não fica ruim, vale dizer. No entanto, fica a sensação de que o longa-metragem estava indo bem demais para esse rumo.


No final, porém, sobra a poesia. Afinal, Enquanto Houver Amor preza pelas palavras, pelas emoções, pelos relacionamentos. As atuações são sempre evidenciadas, com sequências memoráveis. Mas, confesso, nunca mais vou esquecer as palavras ditas por Nighy lá no comecinho do longa-metragem:


— Diga, Edward. — Diga o que? — Que Deus existe. — Você não pode dizer uma coisa dessas para as pessoas. Deus não é uma informação. Deus é uma convicção. É como o amor. Você não pode falar que ama, você precisa sentir que ama.
 

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