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  • Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Napoleão' é épico impressionante, mas que peca por roteiro atribulado



Não é fácil o desafio de contar a história de grandes personagens históricos. Afinal, se são históricos, é certeiro compreender que suas vidas foram grandiosas, marcadas por feitos memoráveis, e que se perpetuam na imaginação das pessoas através das décadas. Napoleão é uma dessas figuras: começou como um militar e, alguns anos depois, se tornou imperador da França, espalhado medo pela Europa e conquistando inimigos. Agora, finalmente vira um filme.


Quem dirige este épico que estreia na quinta-feira, 23, é Ridley Scott, o cineasta por trás de produções diversas como Gladiador, Alien: O Oitavo Passageiro e, mais recentemente, Casa Gucci. É uma tarefa nada fácil. Afinal, como dar conta da vida desse personagem? Como conseguir, em suas quase 2h40, mostrar tudo o que Napoleão viveu (ou, também, não viveu)?


Já foram duas as grandes tentativas de dar conta dessa história impressionante de Napoleão. A primeira veio ainda nos anos 1920, quando o cineasta francês Abel Gance lançou o primeiro filme sobre a vida do imperador. A ideia era fazer uma hexalogia sobre Napoleão, abarcando toda a sua história. Só que não deu nada certo. O primeiro filme teve um custo demasiadamente caro e, sem som, acabou ficando soterrado na era do cinema falado. A hexalogia nunca existiu.


Depois, vem a mais conhecida: a de que Stanley Kubrick, o diretor de 2001 e Laranja Mecânica, tentou adaptar a história do imperador entre os anos 1960 e 1970. O cineasta chegou a dar a missão de coletar dados sobre Napoleão para seu produtor executivo de longa data, Jan Harlan. A primeira versão do roteiro teria ultrapassado as 140 páginas e era esperado mais de 40 mil figurantes. Com isso, estúdio algum quis embarcar nessa empreitada de Kubrick, que acabou seguindo por outros caminhos -- ainda mais após o desastre de bilheteria do filme Waterloo.


Scott, assim, conseguiu romper com uma sina de décadas, que parecia amaldiçoar o cinema. Seu Napoleão, que é uma produção da Sony e da Apple, chega com toda a pompa possível: é um épico de mais de 2h30, com cenas de batalha grandiosas e que não tentam abreviar a jornada do imperador francês em momento algum. O filme começa com sua vitória com o Cerco de Toulon, uma das batalhas mais impressionantes da História, até sua derrocada em Waterloo.



É a vida completa, apoiada em um tripé complicadíssimo de dar conta: a frente militar da vida de Napoleão, com todas essas batalhas que fizeram a Europa tremer; a frente política, com a sua inesperada chegada ao trono francês mesmo após a Revolução Francesa; e um de seus aspectos mais curiosos recaindo na vida amorosa, com a paixão por Josephine (Vanessa Kirby).


Logo de cara, assim, fica até um pouco óbvio qual é o calcanhar de Aquiles dessa produção imensa de Scott: a necessidade de dar conta de um período grande demais da vida de Napoleão, que coisa demais fez em vida, em apenas 2h30. Falta, talvez, um recorte bem mais apurado no roteiro de David Scarpa (parceiro de Scott em Todo o Dinheiro do Mundo), que acaba se enrolando em muita história pra contar. É política, é família, é guerra, é romance, é traição...


Fica a sensação de que tudo é tão inchado, com tanta história pra contar, que nem há espaço para uma reflexão necessária sobre o legado de Napoleão. O que ele realmente fez pela França? Seu papel foi mais positivo ou negativo? Como ele se tornou, enfim, essa figura lendária?


Mesmo com sua longa duração, Napoleão fica estranhamente corrido com tanta coisa para dar conta. Felizmente, o elenco ajuda a diminuir a sensação de que as coisas estão desmoronando: Joaquin Phoenix (Coringa) faz um Napoleão que traz suas inseguranças embarcadas em sua voz que treme e gagueja, querendo se provar sempre; e Kirby, que já tinha brilhado em Pieces of a Woman, volta a trazer uma atuação magnética, convencendo como a sedutora Josephine.


Além disso, mesmo com o roteiro claudicante, Scott sabe entregar as grandes cenas de batalha. Waterloo é magnificamente filmada de cima (com bastante uso de efeitos especiais, é claro), dando a dimensão do que foi aquela última incursão de Napoleão. Ver na tela grande ajuda muito a compreender o alcance daquelas batalhas e como foi grandiosa a sua primeira vitória e, acima de tudo, como foi amarga essa sua última derrota, sem espaço para novas chances.


Napoleão, assim, é um filme grandioso, que causa impacto para aquele que está sendo de frente à tela grande. Você fica imerso na vida desse personagem histórico, avançando em seus momentos grandiosos e, também, naqueles seus maiores fracassos. Tudo isso com atuações que devem beliscar indicações na temporada de premiações. Mas, infelizmente, está longe de ser uma obra-prima. Não há profundidade necessária nos momentos mais exigentes, tampouco uma leitura artística de tudo isso. Fica demais na superfície e não consegue ir além de ser uma grande linha do tempo, muito bem atuada, mas que não encontra o seu verdadeiro coração.


 

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