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  • Foto do escritorBárbara Zago

Crítica: 'O Escândalo' é filme forte, mas que não se arrisca

Quando em 2017 vimos pela primeira vez a hashtag #MeToo ganhar força no Twitter, com inúmeras mulheres relatando terem sido vítimas de assédio e abuso sexual, não se esperava que grandes nomes do entretenimento também estariam envolvidos nas acusações. O primeiro deles, e talvez mais marcante, foi Harvey Weinstein, um produtor norte-americano que foi acusado por dezenas de mulheres da indústria cinematográfica por abuso emocional e sexual.


De todas as mulheres que se pronunciaram no movimento #MeToo, porém, talvez as mais improváveis foram justamente jornalistas da FOX News, canal conhecido por seu apelo republicano e conservadorismo. Gretchen Carlson começou a bola de neve em cima do CEO, Roger Ailes, ao processá-lo por assédio. E é sobre essa história que O Escândalo se debruça.


Megyn Kelly (Charlize Theron) começa guiando o espectador pelo prédio da FOX. Desde o caos da redação até os escritórios de grandes executivos, incluindo Ailes, vivido por John Lithgow (The Crown, Planeta dos Macacos). Assim que o público está familiarizado com o ambiente, como se estivesse dentro dos estúdios, vemos Kelly tendo que lidar com o então candidato à presidência da república, Donald Trump, que a bombardeia de tweets machistas e sexistas.


A segunda mulher que temos contato é justamente Carlson (Nicole Kidman), jornalista que foi rebaixada do horário nobre após revidar comentários sexistas que recebia constantemente de seus colegas. Após mudar de programa, uma de suas funcionárias, Kayla Pospisil, personagem fictícia interpretada por Margot Robbie, tenta subir de cargo justamente indo atrás de Ailes.

Ainda que o longa foque somente na vida das três mulheres, é desesperador vê-las serem atravessadas por esse tipo de machismo, como se estivessem condenadas à uma carreira que depende do bom senso de seus chefes. Mais do que isso, é um filme particularmente doloroso de se assistir quando se é mulher, pois está longe de ser ficção. É algo tão enraizado socialmente que por vezes não somos capazes de perceber quando somos vítimas disso.


O Escândalo ilustra isso de forma competente, principalmente, quando mostra as inúmeras contradições dentro do ambiente de trabalho da FOX, com mulheres defendendo com unhas e dentes Ailes, alegando que nunca sofreram nenhum tipo de assédio dentro do canal, ao mesmo tempo em que são obrigadas a usar saias curtas, enchimentos no peito e saltos que machucam.


O trio dá uma aula de atuação, sendo incrível a similaridade entre Theron e Kelly e Kidman e Carlson. Ainda que o filme tenha um impacto maior dentro dos Estados Unidos, justamente quem tinha contato quase que diário com essas jornalistas, o elenco não deixa a desejar e faz com que esse vínculo entre espectador e personagem seja estabelecido com sucesso.


Todavia, O Escândalo não se arrisca, mantendo-se na zona de conforto quando claramente poderia se aprofundar em certas questões. E talvez o grande problema disso seja o fato de ser um filme dirigido e escrito por dois homens -- Jay Roach (Austin Powers) e Charles Randolph (A Grande Aposta), respectivamente. Não faz sentido algum homens produzirem um filme que fale sobre o sofrimento de mulheres. Sofrimento este, aliás, que que só mulheres entendem.


O Escândalo é um bom filme de entretenimento e agrada fãs de filmes que tenham propostas parecidas com A Grande Aposta e até mesmo o fraquíssimo Vice. A história por si só consegue se sustentar e prender a atenção do público -- com cenas que trazem enorme desconforto por serem baseadas em eventos reais. Todavia, falta um aprofundamento e uma sensibilidade com relação à temática que, de novo, não cabe aos homens fazerem. Poderia ser bem melhor.

 
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