Roberto (Rodrigo Lombardi) é um engenheiro que trabalha há algum tempo numa plataforma de petróleo, no meio do oceano. O mar e um punhado de bons amigos são o que o separa da solidão total. No entanto, as coisas começam a sair do pruma na sua vida quando é promovido a chefe do local, ficando apenas abaixo do rigoroso diretor (Luís Melo). Afinal, ele precisa passar por cima de colegas, inclusive do amigo Vagner (Roberto Birindelli), e deixar a esposa (Maria Luísa Mendonça) e os filhos de lado.
Esta é a trama de O Olho e a Faca, de Paulo Sacramento (Riocorrente), que chega ao seu segundo longa após uma estável carreira como editor. O clima criado pelo cineasta traz a solidão e a onipresença da plataforma a todo momento, em todo direcionamento de câmera. Fruto de um trabalho precioso nos primeiros vinte minutos, mais ou menos, quando Sacramento se dedica a apenas mostrar a rotina e o funcionamento desse local tão pouco conhecido pelas pessoas. É uma solidão que remete ao vazio da Antártica, por exemplo, mostrado no fraquíssimo filme Soundtrack, com Selton Mello e Seu Jorge.
No entanto, aqui, a loucura e o desvario do personagem vai surgindo aos poucos -- ao contrário da interpretação de Selton Mello, no filme citado, que já mostra indícios de desequilíbrio desde o começo. O roteiro de Sacramento e de Eduardo Benaim (Tito e os Pássaros) faz com que a ausência de um amparo ao lado do personagem vá corroendo a sua sanidade aos poucos. É um trabalho propositadamente lento para que, assim, o espectador vá compreendendo toda a conjuntura de fatores que se desdobra na telona.
Vale destacar, também, a boa relação interpessoal entre os personagens que é criada -- principalmente entre Roberto e Vagner. Sente-se que é uma amizade sincera e que possui vínculos que podem ser quebrados a todo momento. De novo, não é algo que traz agilidade para a trama. Pelo contrário: essa ambientação, a cristalização dos vínculos e o aumento da loucura do protagonista são processos lentos, que possuem certa beleza, mas que precisam ser bem aceitos pelo público. Quem espera uma trama ao estilo de A Ilha de Ferro, série da Globo que fala sobre petrolíferas, vai se decepcionar rapidamente.
No entanto, apesar desse bom desenvolvimento de personagens e de situações, O Olho e a Faca possui erros que vão minando a sua qualidade aos poucos. Por mais que o interesse permaneça até o fim, algumas situações vão se mostrando fracas e sem contexto com a trama. Por exemplo: o personagem de Bruno tem uma amante, vivida pela atriz Débora Nascimento (Além do Homem). No entanto, ao invés de aprofundar a trama da personagem, ficam numa superficialidade gritante. É apenas uma cena de sexo, bem pesada por sinal, e uma outra em que ela fala coisas vazias. Pra quê isso?
O mesmo se repete com um rapaz que opera guindaste, que tem um suspense por trás que não se justifica; com uma trama envolvendo o pai do personagem de Lombardi; com a personagem de Maria Luísa Mendonça, que é totalmente subaproveitada. Fica estranho. Ainda mais que o filme tinha tempo para amarrar os arcos. Só que acaba gastando os minutos finais num mergulho metafórico que só deve fazer sentido para o diretor. E olhe lá. As histórias que ali começam, parecem que não terminam. E personagens acabam se transformando em estereótipos pela falta de desenvolvimento.
Grande parte dos atores ainda tenta salvar alguma coisa dessa eclosão, que vem de dentro pra fora, mas não consegue. Lombardi (Amor em Sampa) é o único com tempo em cena o suficiente para evitar a catástrofe, mas ele é limitado. Quem viu qualquer novela com ele sabe disso. O único que traz algo a mais é o ótimo ator uruguaio Roberto Birindelli (Polícia Federal: A Lei é para Todos). Mas, infelizmente, é tirado de cena em momento pouco oportuno. O resto do elenco, como dito, é escanteado. Nada têm a fazer.
Assim, O Olho e a Faca é um filme que prepara muito bem o terreno. Boa ambientação, boa criação de vínculos entre os personagens, boa ideia de desenvolvimento do protagonista. No entanto, quando começa de fato a contar sua história, vai definhando a cada minuto. Histórias mal resolvidas, tramas desconexas, personagens que começam do nada e chegam a lugar algum. Tudo para apostar num final pseudo intelectual que não deve agradar ninguém. Às vezes, afinal, o melhor é apostar no certo e no seguro.
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