Que maravilha é o cinema. E que maravilha é a sétima arte quando surge de fininho, sem fazer barulho, e surpreende a audiência e a crítica. É uma sensação reconfortante, de dever cumprido. Sensação esta que surgiu de forma intensa ao final do filme Lady Macbeth, longa-metragem dirigido pelo estreante William Oldroyd e que estreia nas salas de cinemas brasileiras nesta semana.
Ao contrário do que muitos podem imaginar, Lady Macbeth não é sobre a tragédia inglesa de Shakespeare, já interpretada e reinterpretada no cinema inúmeras vezes. Pelo contrário. Aqui, Oldroyd se vale do novela Lady Macbeth of Mtsensk, do escritor russo Nikolai Leskov. É uma história com outros personagens e com outros acontecimentos, mas que continua a mostrar uma trama de traição e conspiração.
Desta vez, porém, o foco é a jovem Katherine (Florence Pugh), uma jovem ambiciosa e com um “espírito livre”, mas que se vê presa ao casamento de conveniência com Boris Macbeth (Christopher Fairbank), homem muito rico e que não dá a devida atenção para sua esposa. Sendo assim, Katherine acaba se envolvendo com um trabalhador da propriedade de seu marido e mudando a relação das pessoas na casa.
O primeiro grande acerto, e que já é visto logo nas primeiras cenas, é o poder interpretativo de Florence Pugh, a Katherine. Ainda pouco conhecida, a atriz mostra que tem um controle sobre a cena pouco visto, passando sentimentos diversos ao espectador com um único e discreto sorriso. O resto do elenco também é funcional, com destaque também para a atriz estreante Naomi Ackie. Tem potencial.
O grande acerto no filme de Oldroyd, porém, está no roteiro. Curta, gerando pouco mais de 90 minutos de projeção, a história consegue prender o espectador do começo ao fim, com várias reviravoltas ao decorrer da trama -- algumas maiores e outras menores, sem cansar o espectador. A cada mudança no rumo da trama, um suspiro, um som de surpresa na sala de cinema. Afinal, são reviravoltas corajosas, ousadas e que não temem em chocar os seus espectadores.
O choque, aliás, é a grande receita de Lady Macbeth. Duas ou três passagens no filme me causaram horror de verdade -- mesmo sem querer. Afinal, são situações inusitadas para um filme ambientado numa paisagem bucólica e com ares de Orgulho e Preconceito. Quem for ao cinema procurar uma história do gênero, pode dar meia volta. Está mais para um thriller do que para um romance de época.
O único erro -- e que nem sei ao certo, ainda, se é um erro -- é a falta de uma presença maior da direção de Oldroyd, que trabalha mais como um estilo de direção passivo. Não há interferência nas cenas, que mantém a câmera estática na maioria das vezes, sem grandes planos. Além disso, quase não existe trilha sonora, que fica guardada apenas para uma ou outra cena.
Mas nada disso atrapalha a experiência de Lady Macbeth. Filmaço, com F maiúsculo, este é um daqueles filmes que podem passar despercebidos do cinema, já que muitos podem considerar que é mais uma adaptação da obra de Shakespeare ou, se ver os detalhes desta produção por cima, achar que é um singelo romance de época. Mas não se engane: Lady Macbeth é, de longe, um dos filmes mais poderosos do ano.
Comments