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Final explicado: Qual o significado de 'O Menino e a Garça', novo filme de Miyazaki?

Foto do escritor: Matheus MansMatheus Mans


Mahito Maki não poderia estar mais vulnerável. A mãe morreu tragicamente em um incêndio, durante os primeiros combates da Segunda Guerra Mundial, e seu pai agora está se casando com a irmã da esposa morta. Assim, é inevitável que o protagonista de O Menino e a Garça, que estreia nos cinemas nesta quinta, 22 de fevereiro, se sinta deslocado. Não se sente mais parte.


E é aí que o cineasta Hayao Miyazaki, naquele que pode ser seu último filme, entra com toda sua genialidade e sofisticação. Com trama e estética similares ao que vimos em A Viagem de Chihiro, o longa-metragem mostra Mahito se refugiando desse mundo que só entrega o que há de pior – a morte da mãe, a guerra, o envolvimento do pai com a indústria de armas.


O refúgio? Simples: a criatividade. O jovem, depois de passar por um período complicado na casa da tia-madrasta, cuidado apenas por idosas que por ali vivem, desaparece dentro de uma torre que um tio, há muito falecido, ali construiu. O espaço, por mais que traga alguma concretude, é uma zona criativa em que periquitos comem humanos e as pessoas podem transitar livremente entre portas que existem ali, passeando pelo espaço-tempo.


Esse contexto, de um menino se refugiando em um mundo de ideias com a realidade em guerra, traz algo bastante autobiográfico de Miyazaki. Ele, que há anos está ameaçando se aposentar, chega em um momento de refletir qual a principal função da fantasia em sua vida e como suas experiências influenciaram esse seu caminho pelo cinema. É, assim, uma retroalimentação.



Por outro lado, além desse retrato, ele se coloca dentro do filme para questionar exatamente como a fantasia funcionou em sua vida. Refúgio ou esconderijo?, parece que ele pergunta a todo o momento. E, claro, além do personagem do menino, há o cativante personagem da garça, que mente para o garoto a todo o momento. É ela que o faz entrar nessa torre criativa.


“Eu sei que é mentira, mas tenho que ver”, diz Mahito, antes de entrar na torre e embarcar nessa aventura apenas pautada pela imaginação. Oras, isso não poderia ser mais Miyazaki: ele sabe que as realidades que está criando em seus filmes não são verdadeiras. Tudo ali é fabricado para aplacar dores – ainda que ele já tenha dito, em um documentário sobre seu processo criativo, que o “cinema só traz sofrimento”. Mais do que a criatividade, são as mentiras que protegem Mahito, e, por consequência, Miyazaki, do mundo que os cerca.


Além disso, O Menino e a Garça nunca condena as mentiras, tampouco aponta dedos como se fossem o “ópio do povo”. Por mais que grande parte dos personagens veja a fantasia como algo ruim (chegam a dizer que o tio-tataravô endoidou por ler muitos livros), Mahito mostra que não é verdade. É preciso equilíbrio. Também não dá pra inserir elementos do mundo real na fantasia, como periquitos, e esperar que se comportem como tal.


Neste ponto, percebemos a genialidade de O Menino e a Garça, o melhor filme de Miyazaki desde A Viagem de Chihiro: enquanto o mundo reclama de sua possível aposentadoria, o mestre do cinema japonês de animação mostra que precisa de equilíbrio. Não dá para viver mergulhado na fantasia, acreditando que está resolvendo todos os problemas. É preciso ter sua dose de criatividade, mas também é preciso enfrentar o que há lá fora, de frente.


 

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