Escrito por Jorge Amado quando ele tinha apenas 24 anos, Mar Morto talvez seja o livro que mais traga homenagens ao mar, ao cais, aos marinheiros. Afinal, a história se concentra em Guma, um mestre de saveiro que sabe que seu destino é morrer no mar. Ou melhor: nas águas verdes do mar. Mas, mesmo sabendo do seu futuro pouco animador, ele acaba se engraçando com Lívia, uma moça que chega nas redondezas e que atrai Guma como Iemanjá atrai os barcos pra água. É paixão certeira. Assim, logo os dois engatam um relacionamento e passam a viver em constante tensão com Iemanjá.
O livro parece ter uma cadência, um ritmo. Assim como Garota de Ipanema foi composta para reproduzir as marés, Mar Morto parece que segue a movimentação das ondas. Cada página é uma onda que se quebra na poderosa narrativa de Jorge Amado, que vai costurando essas relações da beira do cais. Além de Guma e Lívia, uma série de outros personagens cativantes vão dando as caras e cativando o leitor. É o caso do velho Francisco, da sensual Esmeralda e de outros marinheiros que vão se revelando por ali.
Por isso, a história é gostosa, certeira, cativante. Jorge Amado, mesmo em início de carreira, sabe construir a narrativa. Por mais que seja lenta demais em alguns momentos, ela afaga o leitor. Quase o carrega no colo. E assim, vai desbravando as ondas que, às vezes, se tornam tormentas. A ansiedade que ronda Lívia sobre o futuro incerto de Guma, as besteiras que ele faz, a relação com a família, a figura imponente de Rosa Palmeirão. São várias as tramas que vão gerando toda essa cadência das letras.
O livro também acerta na sua quantidade de páginas. São 285, contando com apêndices. É a medida certa para um livro de Jorge Amado. Nem pouco, nem muito. É bastante para a leitura encaixar, na medida certa, e não ficar insossa ou extravagante demais. Mas também não faz com que o leitor passe vontade. Vale destacar, também, a boa edição de texto. Não há grandes momentos de sobra narrativa. Tudo que está ali é funcional.
Mar Morto, novamente, mostra como Amado é escritor completo. Indo além de Capitães da Areia, a obra mostra como o baiano consegue trafegar por essa região do Brasil que, geralmente, é retratada de maneira estereotipada. Aqui, ele vai além e se aprofunda na alma do mar e das pessoas que pro ali vivem. Difícil falar o nome de qualquer outro autor que consiga entender tão bem as ondas, as marés, os barcos, os marinheiros, Iemanjá. É, enfim, um escritor obrigatório. Com ele, entende-se um importante Brasil.
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