Cuca, Saci-Pererê, mula sem cabeça, Boitatá, Curupira. Esses personagens, tão vivos na memória do País, integram um folclore riquíssimo e cheio de cor, vida, natureza e, claro, brasilidade. No entanto, desde Monteiro Lobato e o Sítio do Pica-Pau Amarelo, não era possível encontrar tais figuras no meio literário. Elas acabaram sobrepujadas por outras linhas narrativas, outras fantasias. Infelizmente, ficou pra escanteio. Mas só por um tempo.
Todo esse folclore, adormecido e esquecido nas aventuras do sítio de Dona Benta, ganharam novos traços. Dessa vez, porém, não pela imaginação de Monteiro Lobato, mas de Gustavo Rosseb. Paulista de 33 anos, o autor juntou essas figuras folclóricas na trilogia de livros de Tibor Lobato -- formada por O Oitavo Vilarejo, A Guardiã de Muiraquitãs e A Carruagem da Morte -- para celebrar a cultura brasileira e se aproximar dos mais jovens.
O resultado, sem dúvidas, é louvável. Com uma narrativa simples, acessível e que traz as figuras folclóricas para um patamar mais humano e real, As Aventuras de Tibor Lobato acerta por não ter medo de experimentar. Mistura muito bem feita de Percy Jackson, Harry Potter e um pouquinho de Desventuras em Série, a obra trafega entre o que faz sucesso entre o público infantojuvenil hoje, mas sem esquecer de tradições e raízes.
Para isso, Rosseb cria uma história interessantíssimas. Dois irmãos (Tibor e Sátir) perdem os pais num incêndio e ficam sem ter para onde ir -- lembra da trajetória dos irmãos Baudelaire?. Depois de muito tempo vagando entre orfanatos, eles acabam encontrando refúgio na casa da avó, uma senhora que mora em um afastado vilarejo do interior. Lá, então, eles acabam sendo confrontados por várias criaturas míticas do nosso folclore.
Sem meandros, o autor vai levando o leitor por uma jornada fantasiosa e cheia de grandes momentos, como há muito não se via na literatura folclórica nacional. Há as homenagens ao que Monteiro Lobato fez e criou -- não é à toa o nome do protagonista, é claro -- e há muitos elementos da literatura de fantasia recente, como as já citadas tramas de Percy Jackson e Harry Potter. É uma literatura de fantasia jovem, brasileira e responsável.
A inserção de elementos folclóricos é, porém, o ponto alto de Tibor Lobato. Tudo é feito de maneira muito natural, ordenada e inteligente. As figuras mitológicas não entram nas páginas e na história apenas para fazer volume. Há sempre um motivo, uma trama ou um sentimento por trás. A melhor sacada, porém, é a entrada do Saci-Pererê, figura de grande importância na narrativa brasileira de fantasia e que, aqui, possui um papel bem interessante.
A jornada de Tibor, Sátir e da avó também é interessante, bem pensada e inteligente. Ao contrário do que poderia acontecer, Rosseb decide não seguir a fórmula já batida de Rick Riordan e afins. Ele vai por um caminho próprio, brasileiro e muito solar. Mostra como a literatura de fantasia tem espaço e força dentro do Brasil, assim como tantos outros nomes que estão por aí, como Cristina Pezel, Douglas MCT e tantos outros. É pra aplaudir de pé.
Os livros de Tibor Lobato, então, constituem um ponto interessantíssimo na literatura de fantasia brasileira, onde se prova que é possível fazer boa literatura a partir das figuras de nosso folclore -- seja para o público infantil, juvenil ou adulto. Basta querer, ter uma boa ideia e perseverança. Rosseb teve. E o resultado são esses livros que merecem um lugar na sua estante.
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