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  • Foto do escritorMatheus Mans

Trilogia do ‘Silo’ tem trama ousada, mas perde fôlego na conclusão


O norte-americano Hugh Howey sempre amou literatura. Não é à toa que, perseguindo seu sonho de se tornar escritor, acabou indo trabalhar em uma livraria para ficar mais perto dos livros. E foi durante esse seu trabalho que Howey escreveu os três volumes da saga do Silo, composta pelos livros Silo, Ordem e Legado. Agora, com a publicação da última história no Brasil, fica claro que Howey conseguiu compor uma trama intensa e mordaz, mas com erros de iniciante.

A saga começa com Silo, onde o leitor é apresentado à uma sociedade distópica que abriga o restante da humanidade em quarenta diferentes silos subterrâneos. Não há contatos entre eles, a não ser para realizar a “limpeza” -- evento esporádico que manda algumas pessoas pro lado de fora, onde reside a incerteza do futuro. É como se seus moradores fossem mandados, de maneira sortida, para o labirinto de Jogos Vorazes, sem saber ao certo o que irá acontecer.

A partir daí, Howey tece uma trama sobre injustiças sociais, sobrevivência e distopia social ao melhor estilo do ótimo filme Expresso do Amanhã. A diferença é que, no longa-metragem de 2013, a sociedade é dividida pelas seções do trem, enquanto na obra literária o povo é separado, por classe social, de acordo com os andares do silo. E é num dos andares mais baixos que fica Juliette, moradora solitária e mecânica experiente que comandará uma nova ordem social.

Nesse livro, o autor norte-americano acerta em cheio em todos os detalhes. A começar pela premissa que, apesar de ressoar em distopias aqui já citadas, traz um frescor às distopias jovens que sempre batem na mesma tecla. Além disso, Howey também cria personagens interessantes e que dão força e vazão para a crítica social apresentada -- ainda que alguns deles, como o Lukas, sejam chatos e te tirem do livro toda vez que aparecem. No geral, no entanto, funciona.

Os problemas de estrutura narrativo de Howey, naturais de quem está estreando no mundo da ficção, são subjugados neste volume da trilogia por conta de grandes acertos. Algumas atitudes dos personagens, por exemplo, são inverossímeis -- por culpa da excessiva falta de descrição interna dos personagens. Só que Howey, inconscientemente, compensa o grave problema com cenas de tirar o fôlego. Há, também, excessos de subtramas e personagens dispensáveis.

Silo, porém, termina de maneira positiva quando viramos a última das 500 páginas. Afinal, o autor aposta num final ousado e, mesmo para quem se ateve aos problemas citados, deve ser recompensado. A vontade de partir para o próximo livro, que tem um capítulo como uma amostra ao final do primeiro volume, fica imensa. O que aconteceu com a Juliette? Como os silos vão ficar daqui pra frente? O que vai acontecer? Como o Hugh Howey vai lidar com a história?

No entanto, lamento decepcionar, Ordem e Legado são absolutamente inferiores à Silo. Não só em questões técnicas, como da própria história. Veja bem: quando você acaba a primeira história, logo você quer saber o que vem a seguir, certo? Só que Hugh Howey reverte essa expectativa e parte para Ordem, livro que conta a origem dos silos e do mundo que foi visto sendo vivido por Juliette. Ou seja: logo no começo, a expectativa é quebrada e começa uma trama nova.

A partir daí, então, Howey comete um erro de principiante ao inserir uma tonelada de novos personagens -- que já existiam aos montes em Silo. Ou seja, é o caos. Além do livro ganhar uma nova e inesperada roupagem, personagens e subtramas vem e vão sem avisar e sem deixar claro para que servem. É impossível não se confundir com tudo o que acontece e, ao mesmo tempo, ficar entediado com algumas passagens sem grandes momentos, como a do Silo 17.

E não entendam mal. Ordem não é um livro ruim. Longe disso. A história de origem do que é visto no Silo é interessante, mas não faz muito sentido naquele momento. Oras, por qual motivo esse livro não foi publicado antes? E convenhamos, se Howey fosse um pouco mais hábil, saberia -- desde o primeiro livro -- mesclar as duas passagens do tempo para dar ritmo a história e, naturalmente, poderia ir limando alguns personagens e cenas sem função narrativa.

A hecatombe da saga, porém, chega com Legado. Extremamente inferior aos dois primeiros em termos técnicos e narrativos, o livro se perde num amontoado vergonhoso de histórias e personagens -- não é à toa que uma série de acontecimentos vai limando a quantidade de personagens. É verdadeiramente impossível lembrar de quem é cada um, ainda mais se você leu de acordo com datas de publicação no Brasil, e, muito menos, criar empatia além de Juliette.

Assim, a saga do Silo não é de todo ruim: conta com personagens femininos fortes, uma boa premissa e um senso de causa-efeito no leitor que impressiona no primeiro livro. Só que, como é natural de um escritor iniciante, ele vai se perdendo em meio a grandiosidade e não consegue manter a qualidade até o final, fazendo com que os erros se tornem muito mais gritantes a cada página. Uma pena. Mais um distopia adolescente desperdiçada e sem muito futuro.

No entanto, vale a pena acompanhar a carreira literária de Hugh Howey. Ele deve aprimorar seus talentos, como é natural, e vir com livros melhores e mais bem acabados. Desta vez, infelizmente, não deu.

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