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  • Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Democracia em Vertigem' é documentário essencial na Netflix


Petra Costa é uma cineasta de mão cheia. Talvez a melhor documentarista em atividade no Brasil. Começou com o belíssimo e poético Elena, que mostra a busca da diretora pela irmã nos Estados Unidos. Depois veio o documentário dramatizado Olmo e a Gaivota, que faz uma busca existencial durante o período da gravidez. E agora, ela deixa a introspeção de lado para falar de um assunto de caráter nacional: os rumos sombrios que a política tomou no Brasil desde 2013, quando as manifestações tomaram as ruas.

Mas, ao contrário do que parece num primeiro momento, o filme Democracia em Vertigem não é apenas um trabalho de observação dos bastidores como em O Processo, de Maria Augusta Ramos, ou um registro histórico como em Excelentíssimos. Aqui, Petra volta a colocar humanidade e poesia com resgates familiares, percepções e outras lembranças de tempos passados. Mistura a história de sua família com o cenário político brasileiro. Avanços e recuos da democracia acompanham a sua história pessoal.

E, desta maneira, este novo filme original da Netflix se torna o melhor feito até agora sobre os significados políticos, históricos e sociais que os últimos seis anos causaram no Brasil. Não são apenas bastidores, registros históricos para usar na sala de aula ou análises econômicas (como no ótimo documentário Dedo na Ferida). A história contada por Petra, além do valor intrínseco, também avança para a identificação do espectador com o o que está sendo contado. Dá pra compreender e entender a Petra e o Brasil.

Aos que buscam um documentário que traga isonomia de relatos, pode se frustrar. Petra é declaradamente de esquerda. Comemorou as vitórias de Dilma, lamentou o golpe, é filha de um casal que lutou contra a Ditadura Militar. Não dá pra esperar que a cineasta se mostre favorável ao crescimento do obscurantismo da direita -- afinal, esta direita, no poder, é a última a querer um documentário analisando fatos sociais dos últimos anos. Este é um filme para aqueles de esquerda e para os que buscam diferentes linguagens.

Ainda assim, porém, a diretora faz um mea culpa sobre os anos do PT no poder. Admite que Lula se curvou aos interesses de bancos e financeiras, mostra que o lado social poderia ter sido mais aprofundado. Poderia ter acontecido uma reforma política, social e econômica. Mas ficou de lado e, hoje, as coisas são como são. No entanto, vendo este filme como um crítico à todas as formas de governo, percebo que Petra poderia ter ido um pouco além. Dava para ter trazido mais algumas crítica à luz da câmera e da Netflix.

Mas tudo bem. De resto, a diretora faz um trabalho exímio. Traz imagens de bastidores inéditas, como Lula dentro da sede do sindicado, antes de ser preso; de Dilma vendo a votação do impeachment na Câmara e as suas reações; e até algumas conversas com o agora presidente -- e então deputado federal -- Jair Bolsonaro. É, em suma, uma fotografia muito bem feita e que, com a bem pontuada narração da própria diretora, ajuda o espectador a compreender melhor os rumos que a política nacional tem tomado.

O sentimento, ao final, é de que Democracia em Vertigem faz o que ninguém tinha conseguido fazer até então. Ainda que com um viés de esquerda, Petra Costa consegue trazer bastidores, análise histórica, econômica e política num longa-metragem de duas horas. Ao terminar o filme, caso a visão do espectador já não seja decididamente de direita, há coisas a se refletir, pensar, analisar. Os rumos tomados pelo Brasil, nos últimos anos, não são naturais. Há muita coisa por trás, muita sede por justiçamento. E o que isso significa? O melhor é ver o documentário e chegar em sua própria conclusão.

E, enfim, um filme necessário. Bola dentro da Netflix, que se mostra cada vez mais interessada em produtos de qualidade do que num única vertente política. Afinal, lembre-se: a mesma empresa que agora lança este filme, lançou O Mecanismo.

 

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