Estou numa fase de fascinação com o trabalho de Susanna Lira. No final de semana, voltando de uma viagem, assisti ao ótimo Nada Sobre Meu Pai no avião. Fiquei fascinado. É um filme extremamente pessoal, mas também muito político. Por isso fui com sede ao pote assistir a Foge-me ao Controle, documentário que mergulha na história da escritora Fernanda Young.
Parte da programação do festival É Tudo Verdade 2024, o longa-metragem é isso: um filme que busca compreender a complexidade dessa intelectual brasileira, roteirista de conteúdos que marcaram gerações, como Os Normais, além de textos menos conhecidos, mas ainda mais geniais, principalmente poesias. E como dar conta de uma personagem complexa como ela?
Lira não se amedronta. Ao invés de fugir da complexidade, ela a abraça e usa como linguagem. O filme se afasta daquele formato mofado de documentários que misturam arquivos e entrevistas quadradas, que encaixotam os entrevistados, e se vale de um texto mais experimental. Fernanda Young se revela em entrevistas, textos, memórias, escritos perdidos.
Mas, mais do que isso, Foge-me ao Controle tem um diferencial: sabe como contar essa história com esse estilo mais livre, leve e solto. A edição não é blocada -- é bem mais natural, fluída, tranquila. Sentimos a história avançar como em um suspiro. Os temas vão se sucedendo, como é normal em uma narrativa como essa, mas sem aquela artificialidade de tópicos.
Nessa mistura, junto com uma personagem extremamente interessante e pouco compreendida, Foge-me ao Controle é uma das grandes surpresas do ano até aqui. Enquanto filmes como Brizola, também na competição do festival, se contentam com o didatismo, este longa-metragem de Lira explode em experimentação, ousadia narrativa e criatividade estética.
É claro que, mesmo dentro da experimentação, o filme acaba caindo em uma ordem cansativa -- percebemos logo as sacadas narrativas de Lira e como elas se sucedem na narrativa original. No final, surge certo cansaço. Mas tudo bem: o longa-metragem acerta, emociona e, acima de tudo, honra o legado de Fernanda Young, morta tão jovem. É a celebração de seu trabalho, como a continuidade do que ela fez. Dá a sensação de que Fernanda aprovaria o documentário.
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