David Bowie é uma figura complexa, cheia de camadas. Não à toa, é mergulhado em diferentes personalidades que, tal como Fernando Pessoa, tinha diferentes características artísticas, olhares, pensamentos, reflexões. Só um filme tão complexo quanto Moonage Daydream para dar conta. Dirigido por Brett Morgen (Cobain), o filme chega aos cinemas nesta quinta-feira, 15.
Assim como os outros filmes do cineasta, aqui não encontramos um documentário linear -- daqueles com começo, meio e fim bem delimitados e ornamentados com entrevistas quadradonas. De caráter experimental, mesmo com mais de duas horas de duração, o filme se vale de imagens de arquivo de Bowie dominando a tela. No áudio, entrevistas passadas.
São poucos os momentos que Morgen segue com formato tradicional. Quase sempre, a tela conta com vídeos, clipes e shows de Bowie, além de imagens produzidas pelo próprio artista. Às vezes a conexão com o tema tratado surge naturalmente, às vezes vem só com o tempo -- o que exige um comprometimento do espectador com a trama; não dá para assistir vendo o celular.
Aliás, falando em temas, essa é a grande aposta narrativa de Morgen. Ao invés de dividir em uma linha temporal, falando de nascimento, crescimento, começo da vida artística, sucesso e morte, o roteiro abraça blocos de temas. Fala sobre o personagem Ziggy Stardust, sobre a relação com os pais, as mudanças intermináveis, a relação com o amor e com o sucesso...
Ainda que pareça um pouco sem conexão no início, aos poucos Moonage Daydream se revela como um mosaico completo e complexo sobre quem era Bowie. Por meio desses grandes temas, sem nunca cair na mesmice, Morgen faz um perfil detalhado. Bowie, a partir do caos e da imprevisibilidade do filme, se revela. É como mágica, onde a ordem aparece da desordem.
Com isso, Moonage Daydream nos presenteia com alguns momentos realmente especiais. As falas de Bowie antes da execução do clássico absoluto Space Oddity, por exemplo, é de uma genialidade ímpar: faz com que a canção ganhe mais camadas e significados, todos ligados com o que Bowie falava, fazia e pensava naquela época. Espetacular; um dos grandes momentos.
Moonage Daydream só peca pelo excesso. De maneira alguma o filme precisava de 2h15 de duração. Podia ter meia hora a menos. Seria menos cansativo, já que o filme exige tanto do público. Mas tudo bem: ainda assim, é um grande documentário, que sabe como lidar com a figura complexa de David Bowie. No final, ele se torna ainda mais especial para o público.
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