Foi o livro As Coisas, de Tobias Carvalho, que abriu mais um período de parceira entre o Esquina e o Grupo Editorial Record. Chegou embalado, como todos, num papel marrom, cheio de suspense. Mas logo que o livro escapa desse invólucro, surpreende. De capa vermelha, fininho, a obra ostenta título de vencedor do Prêmio SESC de Literatura em 2018. É, em resumo, uma reunião de contos que falam sobre a vida de um homem gay em Porto Alegre. E indo além dos estereótipos, como falamos na crítica.
Ao fim da leitura, a sensação é boa. Assuntos, tratados de maneira clichê ou, então, ignorados pela grande mídia, são abordados de maneira natural, suave, como deve ser. Por isso, foi providencial quando Tobias, porto-alegrense de 22 anos, procurou o Esquina para agradecer o texto crítico. Foi a ponte perfeita para ir da conversa informal no Instagram para um entrevista, deixando a história de As Coisas registrada numa das páginas do site. Abaixo, confira a conversa completa com Tobias, por e-mail:
Esquina da Cultura: De onde surgiu a ideia de fazer 'As Coisas'? Você escreveu todos os contos unicamente para o livro? Ou já tinha escrito e foi selecionando para formar uma narrativa geral da obra?
Tobias Carvalho: A ideia para o As Coisas veio do meu Google Drive. Eu percebi que meus contos tinham personagens gays com bastante frequência, e que fazia bastante sentido fazer um livro em que houvesse uma unidade em torno disso. O prazo de inscrição do Prêmio Sesc foi meu incentivo para tocar a produção do livro. A maioria dos contos foram escritos nos meses anteriores a esse prazo. Alguns contos eu já tinha mas não se encaixavam na temática, de modo que fiz algumas modificações. A maioria, no entanto, foram escritos pensando que fariam parte de um livro, mas não posso dizer que pensei tanto nisso de «narrativa geral da obra» quando terminei o livro.
Esquina: Você é jovem, acabou de vencer o prêmio SESC de literatura e está conhecendo agora o mercado. Qual era sua expectativa e qual a real percepção sobre o mercado editorial?
Tobias: Eu não fazia ideia de nada. Achei que conseguir uma editora era questão de paciência, mas que, uma hora ou outra, a Companhia das Letras leria meu original e iria gostar. A verdade é que, dada a dimensão dessa crise, quem tem menos chances são os autores estreantes. Principalmente os brasileiros. Nesse contexto, o Prêmio Sesc foi uma baita catapulta.
Esquina: 'As Coisas' desfaz alguns estigmas que são depositados no público gay, quase sempre retratado de uma forma romântica e pouco crível na mídia, cinema e literatura. Qual a importância de trazer um livro como o seu, que quebra alguns preconceitos e mostra o lado da 'vida como ela é'?
Tobias: Não acredito que o livro tenha uma importância para além do que qualquer ficção tem de importância: fazer o leitor ter outra visão, uma visão específica. Houve até algumas respostas de leitores que disseram que não gostaram do livro por acharem que ele é uma expressão redutora da «experiência gay», que nem todo homossexual tem relações efêmeras, etc. E, é claro, o livro é uma expressão redutora da experiência gay. Eu nunca me senti responsável por escrever um tratado sobre o assunto, algo que representasse todo mundo. Nunca quis ser porta-voz de nada. Tomei escolhas estéticas de acordo com as histórias que eu queria contar, e estou satisfeito com isso.
Esquina: Você tem inspirações para seus contos? O que te motivou?
Tobias: Claro, a maioria da inspiração vem da própria observação da vida. Nesse aspecto, acredito que não tive sucesso em esconder que existia uma identificação do autor com os narradores, mesmo com todos os artifícios. É claro, as cenas dos contos são específicas, não foram coisas que eu vivi, mas o sentimento (ou a aparente falta dele) são coisas que vêm de mim.
Esquina: Já tem novos projetos, planos? Algum novo livro engatilhado?
Tobias: Engatilhado não, mas em produção. O próximo vai ser um romance. A ver se consigo ter sucesso nessa empreitada.
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