Confesso que me peguei surpreendido enquanto assistia a A Semente do Mal, longa-metragem de terror que estreia nos cinemas nesta quinta-feira, 13. Dirigido pelo português Gabriel Abrantes, do elogiadíssimo Diamantino, o longa-metragem leva uma hora para engrenar -- e, quando pega no tranco, surpreende com decisões que fogem da lógica do terror comercial.
A história, porém, começa de um jeito que lembra qualquer outro filme de terror já feito: um rapaz (Carloto Cotta), querendo descobrir mais sobre seu passado como uma criança adotada, vai atrás do irmão gêmeo que mora no interior de Portugal. Lá, não apenas encontra um rapaz que é sua cópia, como a mãe (Anabela Moreira): uma mulher bizarra, cheia de plásticas.
Mas o protagonista aqui não é nenhum dos irmãos, nem a mãe, mas Brigette Lundy-Paine (da série Atypical), que interpreta a namorada que acompanha o parceiro nessa busca familiar.
Durante uma hora de filme, Abrantes -- que assina não apenas a direção, mas também o roteiro do longa-metragem -- apenas insinua algumas ousadias. É interessante a forma que retrata a tal matriarca, por exemplo. Algumas pessoas reclamaram que o filme erra nisso, ao transformar a aparência de uma mulher em horror. Bobagem: o excesso de procedimentos estéticos é um terror moderno, uma forma de alteração corporal que pode, sim, causar medos.
É como Stephen King muito bem falou na obra Dança Macabra, onde analisa o que é o terror: é tudo aquilo que nos é estranho. Oras, não temos como normalizar plásticas que deformam.
Passado isso, A Semente do Mal traz um final chocante, que foge de vez dos padrões impostos no cinema de horror comercial. Esqueça as boas obras que nos chegam pelas beiradas, no cinema independente. Não vemos, de forma alguma, filmes com este tipo de resolução, sem o medo de chocar e de cutucar tabus. Fico pensando a reação de uma plateia de cinema, na sala escura, se deparando com a resolução de Abrantes -- uma mente, de fato, independente.
Assim como aconteceu com o potente Imaculada, elogiado aqui no Esquina, o final faz com que todo o restante do filme ganha um novo ar. Brigette Lundy-Paine, artista que se identifica como uma pessoa não-binária, mostra que pode ser uma nova aposta do cinema de terror: não apenas sabe criar o suspense, como também sabe gritar muito bem. Atuação surpreendente.
A Semente do Mal está longe de ser um grande filme -- sequer traz boas reflexões como Imaculada, um dos melhores filmes do ano para mim. Ainda assim, mostra um ar de originalidade em sua criação, com Abrantes mostrando que dá para ir além do básico. E arrisco dizer que se não fossem os jumpscares excessivos, sem propósito, seria um filme ainda melhor.
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