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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Priscilla' acerta ao não esconder relacionamento abusivo com Elvis



Se Elvis é um filme explosivo, cheio de movimentos de câmera, Priscilla é contido. Se Elvis é colorido, Priscilla está mais puxado para o pastel. Se o filme de Baz Luhrmann é uma ode ao personagem-título, o de Sofia Coppola toca apenas uma música de Elvis – e em um momento bem discreto e intimista. E ainda que o longa-metragem de 2022 seja realmente bom, não é páreo para a qualidade de Priscilla, filme que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 4 de janeiro.


Dirigido e roteirizado por Sofia Coppola, o longa-metragem se concentra unicamente na história do relacionamento entre Priscilla (Cailee Spaeny) e Elvis (Jacob Elordi). Não há desvios de atenção aqui para a carreira do Rei do Rock, tampouco algum deslumbramento com os personagens em cena. O longa, inspirado no livro de memórias de Priscilla e produzido por ela, tem uma preocupação: mostrar detalhadamente o que é um relacionamento abusivo.


O fato de ser o casal, um dos mais emblemáticos da história da música norte-americana, é um detalhe – o filme, obviamente, não tenta ser uma denúncia, já que Priscilla falou abertamente sobre isso várias e várias vezes. Sofia (de filmes marcantes como Maria Antonieta e Encontros e Desencontros) volta ao tema do relacionamento para mostrar como o abuso verbal é uma violência que fere, danifica e machuca, mesmo se tratando de um casal importante como esse.


Em termos de narrativa, Priscilla às vezes parece um filme vazio. Pouca coisa realmente acontece: ela conhece Elvis quando ainda estava na escola, fica apaixonada e deslumbrada, se torna um bibelô para o cantor e, enfim, começa a ser tratada como uma ninguém. Um caminho óbvio em uma trama sobre relacionamentos abusivos e que não é potencializada por subtramas desnecessárias. É um filme sobre os dois. E ponto final. Sem recursos aleatórios, sem frufru.



Para criar a ambientação, que é um dos pontos altos do filme, Sofia Coppola se preocupa com todos os detalhes, cada frame do longa. A começar pela paleta de cores, que começa vibrante e aos poucos vai para tons mais pastéis, e até chegar na escolha de atores – que contribuem enormemente para a mise-en-scène. Cailee Spaeny, a atriz de Priscilla, tem apenas 1,50m. Jacob Elordi, o Elvis, tem impressionantes 1,96m. Em cena, a diferença se torna mais gritante.


Elvis, na composição de Sofia Coppola, se torna uma espécie de ameaça constante para Priscilla. Mesmo quando está sendo carinhoso, sua fisicalidade ameaça a esposa. A forma que a cineasta filma as interações, aliás, também ajuda nesse processo: Priscilla está sempre buscando o olhar do parceiro, enquanto ele está sempre distante. Quando olha para ela, geralmente está fazendo algum juízo de valor ou, até mesmo, falando algo absurdo.


A dupla de atores, aliás, é o outro ponto alto de Priscilla. Elordi (de Euphoria e de A Barraca do Beijo) faz um Elvis diametralmente oposto ao de Austin Butler: ele é todo sem jeito, gaguejando e balbuciando quando precisa falar algo importante, mas que não pensa duas vezes antes de desferir uma agressão verbal contra a esposa. A violência fica ainda mais evidente com esse contraste. Já Cailee (Suprema) traz emoções nos detalhes, com poucos momentos de explosão, funcionando bem desde essa adolescente apaixonada até a mulher sofrendo de solidão.


Priscilla termina em um grito de liberdade. Sofia Coppola clama por isso, celebra isso. Lembra um pouco o que Spencer apresentou sobre a vida da Princesa Diana, mostrando as complexidades de um relacionamento abusivo e o suspiro que chega quando ele acaba. É, assim, um filme que vai além das aparências e que tem algo muito concreto a dizer, com uma direção que sabe o que quer contar. Já é, pra mim, um dos melhores filmes de 2024.


 

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