Hellboy é um personagem que é sucesso nos quadrinhos, mas que nunca conseguiu repetir o mesmo brilho nos cinemas. Guillermo del Toro é o que chegou mais perto, mas os fãs sempre reclamaram de como são filmes mais solares do que deveriam, abraçando aquele mundo de fantasia que o mexicano ama. Agora, na quarta tentativa, Hellboy e o Homem Torto se aproxima dos quadrinhos e fãs, mas o resultado é o mais desastroso até agora.
Estreia dos cinemas desta quinta-feira, 5, o longa tem uma proposta totalmente diferente do que vimos até então: Hellboy (Jack Kesy) começa já em uma missão, sem muita explicação. Ao lado dele, Bobbie Jo (Adeline Rudolph). Quem é? Não sabemos – nos resta, logo de cara, aceitar aquela parceria. Aos poucos, o diretor Brian Taylor (Mãe e Pai) vai complicando essa missão: bruxas vão surgindo, mortos vão renascendo, o além ressurge.
O filme fica restrito nessa missão, nesse espaço, nessas circunstâncias. Ao invés da megalomania dos longas de quadrinhos, Taylor vai para o minimalismo. O ambiente é mais controlado e o tom deixa aquela coisa de salvação do mundo para ser mais um folk horror, que nos últimos anos está em alta com filmes que vão desde A Bruxa até Lamb. A pancadaria dá lugar para feitiçarias, luta com zumbis e até a receita de um artefato bruxo.
Hellboy, enquanto isso, é um personagem bem diferente daquele vivido primeiro por Ron Perlman (O Nome da Rosa) e, depois, por David Harbour (Stranger Things), em 2019. Aqui, ele é mais niilista. Em um mundo devastado, em que a magia parece estar sempre trabalhando para o mal, ele não vê esperança – fracassou e tudo ao redor foi junto. Mesmo com uma força descomunal, vê as coisas acontecendo de maneira passiva, até cansada.
Ou seja: há até um verniz autoral aqui, que deve ser fruto da colaboração de Taylor com Mike Mignola, o criador de Hellboy. É um clima bem diferente e que poderia render um filme de boas propostas, principalmente nesse enclausuramento e no tom niilista do “vermelhão”.
Só que as coisas não avançam. Primeiramente, por limitações de roteiro. Não há clareza no que está sendo contado e aquela proposta inicial, de começar no meio de uma missão para desenvolver os personagens enquanto ela vai ficando mais compreensível, falha demais. Vira bola de neve: não entendemos as intenções dos personagens pela falta de compreensão da história e não compreendemos a história pela fraqueza dos personagens.
Em um segundo momento, percebe-se um orçamento muito apertado para o filme. Hellboy e o Homem Torto custou apenas US$ 20 milhões – o primeiro, de 2004, custou US$ 66 milhões já naquela época, enquanto o remake de 2019 ficou em US$ 50 milhões. Isso não é problema, claro, se esse pouco valor for bem usado. Mas não é: um guaxinim parece saído de um jogo de PlayStation dos anos 2000, dando ao filme uma cara de filme feito por fãs.
Não tem como dizer que isso é coisa boa. Pelo contrário: parece resumo de tudo de errado que há em Hollywood nos últimos tempos, indo desde a decisão da Disney em mudar a história de Star Wars em A Ascensão Skywalker até os últimos filmes da Marvel, como Deadpool & Wolverine, que não se preocupam com história, mas com participações para que o público grite enquanto o filme passa. É a cultura dos fãs mudando o cinema.
Há uma chance de que fãs dos quadrinhos de Hellboy enxerguem este filme como genial, disruptivo, criativo. Mas é preocupante quando um longa busca dialogar com uma base muito restrita de fãs, esquecendo de todo o resto. A conversa encurta, pouca coisa sobra e o cinema, tristemente, passa a ser algo cada vez mais nichado, dialogando de fato apenas com alguns. E a boa história, que fica realmente marcada na memória, é deixada de lado.
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