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Foto do escritorMatheus Mans

Edison Veiga fala sobre literatura, História e Santo Antônio, tema de seu novo livro


Não é fácil contar a história de um santo. Ainda mais a história de um santo como Antônio de Pádua, o santo português mais brasileiro que existe. Franciscano, "pai de casamentos", orador exímio, padroeiro de quermesses em todo o Brasil. Santo Antônio é o santo de todas as causas, de todos os brasileiros. E é sobre isso que fala Santo Antônio, biografia leve de Edison Veiga.


O autor, jornalista com passagem em grandes veículos de mídia no Brasil, parece que foi transportado para a Idade Média, viu a jornada de Santo Antônio, voltou para nossos tempos e contou tudo nesse livrinho de capa amarela. É uma leitura que passa rapidamente, mas de maneira completa e saborosa -- como contamos em mais detalhes na crítica aqui do 'Esquina'.


"Não encontrei nenhum [livro] que tivesse a minha proposta: focar mais no lado humano e, mesmo com as limitações decorrentes da distância temporal, real de Antônio -- e compreender os aspectos geográficos, quase turísticos de sua biografia", conta Edison Veiga, em entrevista ao Esquina, sobre o que o motivou a escrever a biografia Santo Antônio, publicado pela Planeta.


Abaixo, confira a conversa completa entre o Esquina e Edison Veiga sobre seu novo livro.


Esquina da Cultura: De onde veio a sua ideia de fazer um livro sobre a vida de Santo Antônio?


Edison Veiga: Veio mesmo da inquietação jornalística. Em 2017, quando eu estava planejando aquele que seria meu ano sabático da Itália, comecei a pensar sobre quais projetos eu gostaria de fazer ao longo do período. Ocorreu-me um livro. Tenho essa mania de insistir em publicar livros, mesmo sabendo que é uma luta inglória. Não tem jeito. Insisto em colecionar fracassos. Então comecei a imaginar o que poderia vir a ser interessante, considerando as ligações entre Itália e Brasil e observando lacunas temáticas do mercado editorial brasileiro. Cheguei a Santo Antônio. Porque o catolicismo é forte nos dois países e, embora existam muitos livros sobre o personagem em catálogo, não encontrei nenhum que tivesse a minha proposta: focar mais no lado humano e, mesmo com as limitações decorrentes da distância temporal, real de Antônio -- e compreender os aspectos geográficos, quase turísticos de sua biografia. Este último ponto foi fundamental: como Santo Antônio foi um andarilho por excelência, um livro sobre ele tinha de trazer essa marca. Como repórter, gosto de sujar os sapatos. Viver um ano na Itália me deu a oportunidade de percorrer boa parte dos caminhos antonianos.


Esquina: Como foi o trabalho de pesquisa? Como encontrar tantas informações, muitas delas antigas e desencontradas?


Edison: É muito difícil separar o que é fato e o que é ficção de um personagem como Santo Antônio. Primeiro porque ele viveu há 800 anos. Na época, registros eram parcos. Também há o fato de que sua fama posterior, de milagreiro e de ser extraordinário, fez com que à vida dele se somassem uma infinidade de lendas, causos e tradições. Eu preciso me ater a alguns critérios para conseguir extrair, se não a verdade absoluta -- essa musa inatingível --, ao menos uma versão o mais fidedigna possível. Em uma fase preliminar, iniciada ainda no Brasil, busquei os livros que melhor traziam a biografia dele. Consultei vários, mas os mais fundamentais, em minha opinião foram os de Frei Basílio, de Fernando Félix Lopes e de Giustiniano Scrinzi. São edições antigas, só encontrei em sebos. Lendo esses relatos, procurei me ater com mais cuidado aos pontos de convergência e aos de divergência. Nesse processo foram surgindo outras leituras, tanto livros quanto artigos de imprensa -- estão todas listadas na bibliografia do livro. Fui cruzando isso com referências históricas -- e não foram poucas as incongruências, que já me obrigavam a eliminar informações que claramente não poderiam ter ocorrido. Já na Itália, mantinha essas leituras em paralelo com as andanças. Então podia não só conhecer mais pelos registros museológicos ou mesmo informações encontradas nas igrejas dedicadas a ele ou a seus contemporâneos, como também observar, ver e analisar os ambientes, os entornos, o "meio ambiente antoniano", digamos assim. Pesquisei ainda, mas à distância, junto a instituições portuguesas, desde o Arquivo da Torre do Tombo até registros diocesanos de lá, entre outros documentos.

Esquina: Há sempre um misticismo ao redor dessas figuras. Como separar o que é lenda e o que é fato?


Edison: Já falei um pouco disso na pergunta anterior. Então, se me permite, vou avançar um pouco sobre uma questão que me surgiu durante o processo de redação. Em dado momento, eu refleti muito como deveria colocar os milagres ou mesmo aqueles causos claramente fantasiosos sobre Santo Antônio em um livro que, afinal, desde sempre se propôs a ser uma biografia jornalística dessa figura. Minha conclusão -- que acabou desaguando em minha opção -- veio justamente em uma das muitas idas a Roma, para pesquisar no Vaticano. Estava eu observando o Coliseu. Não me parece ser uma questão restaurá-lo tal como ele era quando foi construído, na Antiguidade. Todos os trabalhos de conservação são para mantê-lo como é hoje, ou seja, uma construção histórica que carrega as cicatrizes de seus 2 mil anos de história: marcas de terremotos, guerras, usos diversos no decorrer do tempo, toda a sorte de intempéries. Uma figura como Santo Antônio também deve ser encarada assim: nos 800 anos, muitas das lendas, dos mitos, dos causos e dos milagres, mesmo que inventados, passaram a ser também parte importante para compreender não só o personagem como também tudo o que decorreu desse personagem incrível. Não estou falando apenas de fé, mas também de tradição. Não estou falando apenas de religião, mas também de história. Mas é claro que eu precisava ter algum critério para relatar essas passagens fantásticas. Ou não acabaria nunca o trabalho. Baseei-me no seguinte: todas aquelas histórias mais conhecidas acerca dele, da fama de casamenteiro aos relatos de bilocação, incorporei de certa forma à narração biográfica de Antônio, no decorrer do livro. Já os milagres oficialmente reconhecidos pelo Vaticano, no caso os 53 casos analisados em seu processo de canonização, acabei abordando-os um a um no capítulo destinado a contar como ele se tornou, em recorde não superado até hoje, o santo mais rápido da história do catolicismo.


Esquina: Santo Antônio é um santo de muitas faces — o franciscano, o padroeiro, etc. Como falar de tantos olhares, tantas facetas?


Edison: Acredito que todas essas faces, de certa forma, revelam o mesmo Antônio. Ele foi um ser humano incrível, principalmente se considerarmos a época em que viveu. Era letrado, erudito -- algo extremamente raro em um mundo de analfabetos. Ao mesmo tempo, tinha uma empatia com o povo, sabia se comunicar com facilidade, conseguia traduzir esse conhecimento em linguagem simples e acessível. Os relatos também indicam que era alguém preocupado com as mazelas de seu tempo -- o que, para quem acredita, pode ser visto como uma manifestação de Deus.


Esquina: Tem projetos futuros já engatilhados? O que vem por aí?


Edison: Sempre estou rascunhando coisas, nas pequenas brechas que surgem da labuta diária como jornalista. Como essas ideias vão avançando em paralelo, em meu caótico modus operandi de produção literária, ainda não consigo dizer qual será o próximo projeto pronto, nem mesmo qual ou quais vão afluir em obra pronta -- já que a maioria carrega a sina de ser natimorta.

 
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