Yorgos Lanthimos parece não se cansar nunca: enquanto trabalhava na divulgação de Pobres Criaturas, filme que concorreu ao Oscar em 2024, começou a rodar outro longa-metragem, com boa parte do elenco se repetindo. Assim, menos de um ano após o lançamento do oscarizado, chega aos cinemas Tipos de Gentileza, filme que passou por Cannes e que estreia na quinta, 22.
Aqui, Lanthimos divide o filme em três histórias ao longo de quase três horas de duração: a primeira sobre um homem (Jessie Plemons) que parece ter sua vida regida pelo chefe (Willem Dafoe); a segunda sobre um homem (Plemons, de novo) que tem certeza de que a sua esposa (Emma Stone) não é a mesma pessoa após ficar um tempo desaparecida; e, por fim, sobre dois esquisitões de uma seita (Plemons e Stone) em busca de alguém que ressuscite mortos.
Como qualquer história episódica, que se divide em diferentes narrativas, Tipos de Gentileza é um filme com irregularidades. Algumas histórias são, inevitavelmente, melhores do que outras.
Isso, claro, passa pelas experiências dos próprios espectadores com essas histórias, como cada um se relaciona com as propostas. Na saída da sessão para a imprensa, ouvi pessoas tecendo loas ao primeiro segmento de história, enquanto outros falaram que quase desistiram na primeira hora. Achei a terceira história particularmente engajante, enquanto muitos detestaram. Enfim: parece uma série de TV irregular e inacabada, com episódios melhores do que outros.
Apesar dessa disparidade qualitativa entre as partes, há uma união entre todas elas: falar sobre confiança, subordinação, dependência. São temas que circulam nas três histórias, com roteiro assinado por Lanthimos e pelo parceiro de longa data, Efthimis Filippou (de O Lagosta, Dente Canino e O Sacrifício do Cervo Sagrado). O título fala sobre gentileza, sobre kindness, no título original. Seriam esses assuntos -- confiança, dependência, subordinação -- também gentileza?
É isso que Lanthimos parece questionar. Nos sentidos, aliás, Tipos de Gentileza parece voltar para aquele cineasta indecifrável de outros tempos -- um movimento até que óbvio, ao retornar com a parceria com Filippou, após A Favorita e Pobres Criaturas, dois filmes mais "pé no chão" com o roteirista Tony McNamara. É um cinema mais grego e menos americano, apesar do elenco, e que quer cutucar o que os espectadores podem ou devem sentir na sala de cinema.
Ainda assim, nem tudo funciona tão bem também narrativamente: a qualidade também tem altos e baixos quando o roteiro não sabe muito bem se atentar com alguns significados e ideias que surgem aqui e ali. A segunda história, por exemplo, traz algo de machista e misógino -- e que pode passar desapercebida quando o espectador força outros significados. Há também um gosto pelo choque gratuito, sem razão de ser, seja pela violência ou por cenas sexuais à toa.
Não é nem bancar de puritano ou algo do tipo -- um movimento bem ruim que tem brotado nos cinemas nos últimos tempos. Mas é forçar uma reação de repulsa de qualquer jeito. É ruim.
Tipos de Gentileza, pelo menos, se vale de boas atuações: Plemons está impressionante e sabe modular a atuação de acordo com os diferentes cenários. É fracassado, é obsessivo, é estranho. Pode contar com uma indicação para ele em melhor ator no Oscar de 2025 -- além de Stone correr por fora. O bom desempenho do elenco acaba tirando o peso dos erros de Lanthimos, seja na direção ou no roteiro dessas histórias, e dá a sensação do filme ser melhor do que é.
Lanthimos, assim, não entrega seu melhor: é um filme que tem algo de muito esperto -- e quase genial -- por baixo de algumas camadas, tentando entender a gentileza no século 21 ao falar sobre relações distintas e diferentes sentimentos. O que é gentileza? Como isso se transforma em algo? Uma pena que esse formato de série estrague a experiência geral, com uma instabilidade desconcertante. Pelo menos, não precisamos esperar muito tempo por mais Lanthimos: para 2025, ele vai lançar o longa-metragem Bugonia, de novo com Plemons e Stone.
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